O projeto foi criado para levantar discussões sobre o impacto dos filhos na carreira científica de mulheres e homens. As ações levaram a mudanças concretas no cenário científico brasileiro
As professoras Gislaine Camila Lapasini Leal, do Departamento de Engenharia de Produção, e Grasiele Scaramal Madrona, do Departamento de Engenharia de Alimentos da UEM, foram selecionadas e estão entre as embaixadoras do Movimento Parent in Science na Região Sul do Brasil, que também conta com um pesquisador (pai).
Para quem não sabe, o Parent in Science surgiu em 2016, fundado pela pesquisadora Fernanda Staniscuaski, vinculada ao Departamento de Biologia Molecular e Biotecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A proposta do movimento, que começou com um desabafo nas redes sociais, tem levantado a discussão sobre a maternidade (e paternidade!) dentro do universo da ciência do Brasil e o impacto dos filhos na carreira científica de mulheres e homens, em diferentes etapas da vida acadêmica.
Para a professora Grasiele Madrona as universidades e o meio científico ainda não acordaram totalmente para estas questões. Ela dá como exemplo a licença-maternidade que não é pontuada em ascensão de nível. Além disso, muitos programas de pós-graduação não contemplam a licença-maternidade à suas alunas. “Estes são algumas das questões que deveriam ser revistas”, opina.
Grasiele Scaramal Madrona: universidades ainda não acordaram para o problema
Mãe do pequeno Miguel, de 2 anos e 6 meses, e da Lívia que ainda está no “forninho”, com idade gestacional de 7 meses, Grasiela diz que foram problemáticas como essas que a motivaram a candidatar-se a embaixadora do programa. Ao lado da professora Camila Lapasini, ela integra o Comitê de Mulheres na Ciência do Centro de Tecnologia da UEM.
O edital para seleção foi aberto no início do ano, com o intuito de expandir as ações do Parent in Science e com isso capilarizar a influência do projeto para todo o Brasil, buscando mobilizar redes locais, levantar dados de realidades estaduais do ecossistema científico brasileiro e habilitar soluções para problemas da esfera da maternidade na academia.
Olhar diferenciado
Gislaine Camila Lapasini Leal: "temos dados científicos que demonstram o impacto da licença-maternidade na carreira das mulheres na ciência"
As publicações científicas das pesquisadoras da UEM colocaram a Universidade em segundo lugar entre as universidades de todo o mundo em um ranking global de diversidade de gênero em pesquisa. Para a professora Camila Lapasini, “uma universidade com tal prestígio e reconhecimento internacional precisa estar na vanguarda e lançar um olhar diferenciado nas discussões sobre maternidade e ciência”. Já há ações nesta direção, segundo ela. "A UEM, a partir de demanda do Comitê de Mulheres na Ciência, do Centro de Tecnologia, aprovou a extensâo do prazo para computo da pontuação, nos casos de licença-maternidade, nos editais do Pibic (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica) e Pibiti (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação)".
Além de docente do Departamento de Engenharia de Produção, mãe do Pietro, de 7 anos, e da Victória, de 3 anos, ela é professora dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia de Produção e Ciência da Computação e membro do Manna Team.
Conciliar tudo isso até hoje é um desafio, que já foi bem maior quando foi mãe pela primeira vez. “Tive meu primeiro filho no meio do doutorado e no Programa de Pós-Graduação não sabiam me dar informações sobre a licença-maternidade” diz ela, relembrando um pouco do que foi sua rotina na época.
“Quando meu pequeno completou 3 meses retomei as viagens para orientação e lá fomos nós dois, encarando, inclusive, um evento fora do Brasil”. Na época ela participava das atividades de orientação de alunos, projetos de pesquisa, iniciação científica, entre outras atividades. “Tenho certeza que essa foi ou ainda é a realidade de muitas mulheres da UEM”, afirma.
“Temos dados científicos que demonstram o impacto da licença-maternidade na carreira das mulheres na ciência e precisamos falar sobre isso e definir ações que permitam minimizar esse impacto em nossas carreiras”, conclui.
Pandemia
Para a professora Grasiele a maternidade é ao mesmo tempo transformadora e desafiadora. “Como professora/pesquisadora não foi fácil quando meu pequeno nasceu e está sendo muito mais difícil agora em tempos de pandemia conciliar os cuidados entre o trabalho e ele, que obviamente é minha prioridade”.
Durante a licença-maternidade Grasiele diz que orientou alunos de casa, revisou artigos, participou de reuniões de projetos de pesquisa. Muitas vezes com o Miguel no colo. “Não tenho dúvidas de que com a Lívia será da mesma forma”.
A diferença é que a experiência lhe ensinou que é humanamente impossível manter as mesmas atividades e a mesma produção científica pós-maternidade. “Hoje já não me cobro tanto e sigo fazendo o possível”.
Conquistas
Apesar de novo, o Movimento Parent in Science já conseguiu alcançar algumas conquistas, entre elas o compromisso por parte do CNPq de inclusão de um campo para as licenças maternidade no Currículo Lattes, além de critérios específicos para licença maternidade nos editais de financiamento e bolsas de várias instituições. Significa que, hoje, diferentes editais de financiamento consideram os períodos de licença-maternidade na análise de currículos.