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A humilhação continua, mas calouros parecem gostar

‘O trote está divertido’, diz o rapaz , de unhas pintadas de vermelho antes de sair para pedir troco no sinal; ‘trotes violentos começam como brincadeira’, alerta pró-reitora da UEM

 

A cidade vê novas caras e ouve novos sotaques toda a vez que o ano letivo começa na Universidade Estadual de Maringá (UEM). Nesta sexta-feira (2) não foi diferente.

Na última edição do vestibular, cerca de 43% dos candidatos eram de outros municípios e muitos dos que foram aprovados e se matricularam marcaram presença no primeiro dia de aula. Só que nem todos conheceram as salas de aula.

Quem passou próximo à instituição, no período da manhã e da tarde, viu que, para vários calouros, as lições foram dadas pelos veteranos, do lado de fora dos portões. Eram rostos novos e sotaques diferentes participando do tradicional trote universitário.

Após às 9 horas, quando os termômetros apontavam incríveis 30ºC, o movimento era grande nos arredores da UEM. Os calouros eram facilmente identificados.

Eles andavam descalços e as roupas pareciam retiradas há pouco tempo de mergulhos em baldes de farinha, ovos, terra e tintas – como se vê em peças publicitárias de sabão em pó.

Os cabelos, quando existiam, tinham o mesmo destino. Os veteranos davam bebidas aos calouros e exigiam que eles pedissem dinheiro aos motoristas nos semáforos da Avenida Colombo. Alguns eram até vulgares, como um veterano de Engenharia Química que disse a uma caloura que se aproveitasse do decote da blusa para conseguir dinheiro.

Apesar dos riscos que o consumo de bebida alcoólica e o movimento da Avenida Colombo oferecem, nenhuma ocorrência foi registrada no período da manhã ou do início da tarde.

Os calouros entrevistados alegaram até que estavam gostando das brincadeiras e que, por meio delas, conheceram os colegas de classe e os veteranos. Um deles foi Hugo Kamiya, 18 anos, que veio de Campo Grande, no Mato Grosso.

Aprovado em Arquitetura e Urbanismo, ele ganhou durante o trote o apelido que vai acompanhá-lo durante todo o curso: Picachu. “O trote está divertido”, disse, enquanto exibia as unhas das mãos e dos pés pintadas de esmalte.

Apesar da aparente calmaria, a pró-reitora de ensino, Edinéia Regina Rossi, mostra-se preocupada com o que acontece, no início do ano letivo, fora do portões, onde a instituição não pode intervir.

“Muitos trotes violentos começam como brincadeiras, mas, por conta do consumo de bebidas alcoólicas, os alunos acabam perdendo o controle, gerando conseqüências sérias.”

Nestes casos, a universidade pode solicitar a intervenção policial. Para evitar problemas dentro do campus, há o Disque-Trote e quatro vigilantes por turno no monitoramento. Se algum veterano for pego praticando trote, a UEM abre um processo de sindicância e, dependendo da gravidade, há punições.


Razão do coração

As razões que trazem estudantes de outras cidades para Maringá se concentram na referência positiva que a UEM conquistou em nível nacional.

Mas isso não se aplica a todos. A porto-alegrense Bianca de Carvalho Fischer, 22 anos, optou pela instituição para morar com o namorado. “Conheci ele pela internet”, contou.

“No começo meus pais não gostaram muito da idéia, mas já estão se acostumando.” Ela foi aprovada no curso de Letras e desfilou com os outros calouros na famosa “fila do elefante”.

Para ela, o trote tem de ser assim, descontraído, sem os atos de extrema violência vistos recentemente em outras regiões do País.

 Thiago Ramari