Um dispositivo inédito, simples, portátil e de apenas R$4, promete
facilitar a rotina nos laboratórios, na análise de diversos componentes
químicos presentes em um material. A ferramenta constituí uma fonte de
ionização de amostras para análise por espectrometria de massas ou
demais métodos que incluam a aplicação de amostras via spray. Trata-se
de um facilitador desses métodos.
A boa notícia, é que, ele
elimina a necessidade de equipamentos de grande porte, como cilindros
de gás de laboratório, reguladores e válvulas, que juntos custam cerca
de US$ 15 mil.
Fotos/Ricardo Lopes
Com o dispositivo, a análise de substâncias de qualquer natureza,
como uma gota de saliva, se tornará muito mais simples, já que, bastará
usá-lo para injetar a amostra da substância dentro do espectrômetro de
massas, utilizando apenas um spray de ar e outros materiais encontrados
em farmácias.
Em competições esportivas, por exemplo, o
dispositivo poderá ser usado para a realização de exame antidoping. A
invenção já está rendendo frutos e será capa da edição de junho da
revista Analyst, uma importante publicação internacional na área de
química.
A criação é fruto do pós-doutorado do professor Jesuí
Vergilio Santainer, em parceria com o orientador Marcos Nogueira
Eberlin, feita no Instituto de Química da Universidade de Campinas
(Unicamp).
Santainer é graduado em Química pela Universidade
Estadual de Maringá (UEM), local onde atua como professor. Possui
mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal
de Viçosa, e doutorado em Ciência de Alimentos pela mesma Instituição.
Nos últimos anos, publicou mais de 185 artigos científicos e três
livros.
Como pesquisador, tem experiência na área de química de
alimentos. Atua ainda na manipulação de ácidos graxos funcionais em
animais e desenvolvimento de instrumentação analítica para análises de
componentes bioativos em alimentos.
O DIÁRIO - O que é esse dispositivo e no que ele consiste?
JESUÍ VERGILIO SANTAINER -Antes de falar do
dispositivo, cabe falar sobre o espectrômetro de massas, que é um
equipamento muito caro, pode custar até 400 mil dólares, e que auxilia
no seguinte sentido: ele analisa componentes químicos presentes em um
material, consegue identificar as diferentes substâncias.
Por
exemplo, se você tem alguma solução, um vinho, e quer saber o que ele
tem de antioxidante ou de substâncias benéficas para a saúde,
normalmente se usa o espectrômetro de massas, que vai pegar essas
moléculas, analisar e dizer qual é a substância que está presente. Ou
seja, é um equipamento utilizado para identificar substâncias químicas,
seja de fármacos, alimentos ou de qualquer outra natureza.
Isso
é o que faz o equipamento espectrômetro de massas. O que acontece é
que, para analisar a substância, é preciso colocar essa amostra dentro
do aparelho. Então, até hoje, o que se tinha para colocar essa amostra
dentro do espectrômetro, eram equipamentos de laboratórios, de grande
porte, como os cilindros de gases.
Então, com esse dispositivo
que eu desenvolvi, foi criada uma forma simplificada, manual, que pode
ser usada em qualquer lugar desde que você tenha o equipamento. Assim,
você conseguirá injetar essa mostra dentro do espectrômetro de massa,
usando simplesmente um spray de ar, e dispositivos que podem ser
comprados em farmácia, em lojas de materiais médicos e hospitalares.
Montei
um sistema simples, em formato miniatura, que consigo fazer facilmente
essa injeção no espectrômetro de massas. Trata-se de um facilitador do
espectrômetro de massa, que, de forma simples, consegue injetar uma
amostra dentro desse equipamento.
O dispositivo demorou quanto tempo para ser desenvolvido?
Isso faz parte do meu pós-doutorado, que concluí no final de 2011 e
realizei em um ano no Instituto de Química da Universidade de Campinas
(Unicamp), sob orientação do professor Marcos Nogueira Eberlin. Quando
cheguei para realizar a pesquisa, meu orientador disse que queria alguma
coisa muito simples.
Fiquei pensando e, depois de vários
ensaios pilotos, a ideia surgiu quando eu vi uma pessoa limpando um
computador com spray de ar comprimido. Eu pensei que se eu pegasse esse
ar comprimido e, no lugar de usar um cilindro enorme de nitrogênio ou
de ar sintético, pegasse esse ar e fizesse um sistema de tal modo que
eu conseguisse mandar a substância em forma de gotícula para dentro do
aparelho.
Foi aí que começou toda a parte de trabalho mesmo, na
base da tentativa e erro. Eu comprei uma agulha de injeção, uma
mangueirinha de soro hospitalar e criei uma posição dentro da agulha,
onde entra na agulha um capilarzinho que parece um fio de cabelo, que
fica no meio da agulha. Como o ar passa com uma velocidade enorme
dentro dessa agulha, faz um vácuo na ponta da agulha e cria micro
gotículas.
E isso que é importante, porque a grande sacada foi
essa, porque essas gotículas são tão pequenas, que, quando entram no
aparelho, tem uma boa resposta de dizer qual substancia está ali. Então
com esse desenvolvimento, se tiver uma abelha e um biólogo,
zootecnista ou agrônomo estiver fazendo um estudo, e tiverem um
espectrômetro de massas, é possível tirar uma gotinha da patinha da
abelha, e jogar para dentro do aparelho (espectrômetro de massas) e
dizer qual substância está presente ali.
Também posso fazer isso
com uma lágrima. Não é preciso mais ir em um laboratório, fazer todo
aquele preparo de amostras, mas simplesmente jogar essa amostra dentro
do equipamento. Se eu quiser analisar um alimento, eu posso utilizar
essa técnica também.
Quais os itens que compõem o dispositivo?
Dispõe de uma lata de ar comprimido, mangueiras de soro, uma agulha
de injeção de farmácia, e um capilar de sílica, semelhante a um fio de
cabelo, que tem um buraquinho dentro, onde é feita a sucção.
Quando a criação será colocada à venda?
Em parceria com a UEM e a Unicamp, já foi feita a solicitação de
patente junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI),
então o dispositivo poderá ser adquirido, aperfeiçoado, de uma forma
mais empresarial, desde que seja mantido contato com os pesquisadores
e, evidentemente com os portadores da patente.
Será adquirido
por laboratórios e equipes que trabalham com espectrometria de massas.
Porque realmente é uma forma muito simples e barata. É o que chamo de
popularização da espectrometria de massas, considerando que ela é cara,
necessita de laboratório, introdução de amostras, ou seja,
simplificamos muito todo o trabalho de laboratório que hoje pode ser
facilmente realizado com o uso desse dispositivo.
Quando o produto for colocado à venda, o valor de R$ 4 será mantido?
Acredito que o material tenha elevação de valor, mas vai continuar
sendo muito barato em relação ao que existe no mercado, haja vista a
simplicidade dele.
Quatro reais foi realmente o que eu gastei
entre a lata e essas conexões. Mas é lógico que, uma empresa vai fazer
um aprimoramento desse dispositivo, e provavelmente o preço será maior,
mas ainda assim muito barato, muito aquém do que existe hoje no
mercado.
É o nascimento de uma ideia simples, que pode ter uma
repercussão muito boa para a sociedade e que pode trazer resultados
maravilhosos em relação à composição de vários componentes.
Você esperava que a criação gerasse uma grande repercussão?
Não esperava, mas quando eu fiz o teste, e que deu certo, meu
orientador disse que eu havia encontrado uma coisa preciosa, que com
certeza vai ser muito importante para a comunidade científica.
Como foi a escolha para ser capa da revista em junho?
Nós fizemos esse trabalho, submetemos para a revista, que é renomada
na área de química, eles acharam o trabalho muito bom, um trabalho
inédito, e nos convidou para ser capa.
A revista entendeu que nós deveríamos publicar isso rapidamente, em função do interesse da comunidade científica.
http://www.odiario.com/cidades/noticia/575862/professor-da-uem-revoluciona-espectometro/