Formado na Universidade Estadual de Maringá (UEM) em 1997, o ex-aluno de
Ciências Econômicas e atual professor e pesquisador da Wharton School
University of Pennsylvania, EUA, Fernando Vendramel Ferreira, fez a
abertura da Conferência Internacional de Economia, realizada esta
semana. Falou sobre desafios e oportunidades da nova economia urbana e
do mercado imobiliário americano, assunto que se dedica há mais de dez
anos. Ferreira diz que após o estouro da bolha imobiliária, em 2008, o
pior já passou e o momento é oportuno para os investidores e
construtores americanos. ¿Nos últimos cinco anos milhares de pessoas
adiaram o casamento, o primeiro filho e acredito que tudo isto vai
acontecer agora nos próximos três anos. O mercado vai se recuperar só
por causa deste crescimento no número de famílias. Sempre tem o risco,
mas é uma tremenda oportunidade.¿ Em relação a Maringá, Ferreira
considera que por ser polo regional, atrair moradores e ter muitas
faculdades, o setor imobiliário tem um cenário positivo. ¿Isto é uma
fonte de crescimento muito grande e não vai mudar nos próximos anos.¿
Sobre quem investiu em imóveis nos Estados Unidos, ele avalia que ¿quem
comprou entre 2009 e 2011 fez um excelente negócio.¿ O professor também
afirma que as universidades americanas pagam melhor e investem muito
mais em pesquisa. ¿A Capes e o CNPQ ajudam bastante, mas em termos de
recursos representa 5% do que é investido lá¿.
¿Na região, tem
muita migração de cidades menores para Maringá. Isso é uma fonte de
crescimento muito grande e isso não vai mudar nos próximos anos.
Vai crescer ainda mais¿¿
¿Se uma crise acontecer (no Brasil) e mesmo
que seja uma recessão baixa, a gente não tem muita cobertura, muita proteção, para ajudar
naquele
momento¿¿
O DIÁRIO - Porque o senhor resolveu estudar economia urbana e mercado
imobiliário dos EUA? Alguma relação com o estouro da bolha imobiliária?
FERNANDO FERREIRA - A pesquisa original era de economia urbana, sobre o
porquê e como as pessoas decidem onde morar e qual a importância de
bens públicos nesses locais. Como a qualidade da escola local afeta o
modo das pessoas de morar e o preço dos imóveis. Mas depois aconteceu
nos EUA a crise financeira imobiliária e fez todo sentido concentrar a
pesquisa no que estava acontecendo.
O que provocou a bolha?
Ainda tem muitos estudos para acontecer nesta área. Não é que a gente
sabe 100% como as coisas aconteceram. Nos Estados Unidos têm muita
variação regional, como o Brasil. É um país muito grande e, algumas
vezes, alguns fatos econômicos que acontecem numa região do país, não
necessariamente acontecem na outra. E o começo da bolha nos Estados
Unidos foi assim. Algumas regiões que eram mais ricas, tiveram um
crescimento econômico muito forte. Um exemplo é a Califórnia, onde a
tecnologia levou ao aumento da renda das pessoas, a uma procura maior
por imóveis e os preços aumentaram. Só que, depois de um primeiro
momento, passou o fato inicial positivo, a renda ficou estável, mas os
preços (dos imóveis) continuaram aumentando. E aí foi um mistério, de
como isso aconteceu. As duas explicações mais plausíveis até o momento
tem relação com fatores psicológicos.
Como assim?
O
primeiro deles é quanto a questão da informação e o contágio que isso
provoca. Tem áreas mais tecnológicas, como São Francisco, que cresceram
primeiro e tiveram mudanças fundamentais na economia. Os preços
aumentaram e cidades no interior, mais afastadas de São Francisco,
também observaram esse aumento de preços. Essas cidades não tiveram o
impacto tecnológico, mas com toda a informação pela televisão, de que o
valor dos imóveis estava aumentando, que era o melhor momento para
comprar, o valor subiu. O segundo fato é quando há uma, duas ou três
regiões em que o preço começa a aumentar, começa um crescimento
sustentado por alguns anos e as pessoas começam a achar que aquilo vai
durar para sempre. Isso que a gente chama de expectativa irracional
aconteceu nos Estados Unidos. Todas as pessoas começaram a achar que os
preços dos imóveis iam aumentar 10% ao ano, todos os anos, para sempre.
Mas isso não acontece. Com a facilidade de conseguir financiamento
para construir a casa própria com juros anuais em torno de 5% ou 6%,
compensava investir, pois se achava que o preço ia aumentar 10% e você
pagava juros 6%, a diferença é o ganho. Mas ninguém lembrou que tinha um
risco muito grande nesta estratégia, principalmente porque a
expectativa de crescimento era irrealista.
A hipoteca é comum
nos Estados Unidos para a aquisição de carros, móveis, para
investimentos. Este mecanismo teve influência nesta crise?
Aconteceu
principalmente no período anterior à crise. Mesmo as pessoas que já
tinham comprado uma casa anteriormente, por 200 mil dólares, quando o
preço aumenta para 300 mil ou 400 mil, a pessoa pode ir num banco,
pedir um segundo empréstimo, sobre a diferença entre os 200 mil e o
valor que aumentou e o banco cede o empréstimo e pega a casa como
garantia. Isso é muito comum lá. O jeito mais fácil de pegar dinheiro
era ir ao banco e, em vez de ir no caixa passar o cartão, ia conversar
com o gerente, falava que tinha a casa, e pedia um novo empréstimo. Isso
também contribuiu para a bolha. Contribuiu principalmente na parte
final. Nos últimos dois anos, 2006/2007, o nível de endividamento
disparou. Como as pessoas se endividaram muito, quando os valores caíram
foi um desastre para todo mundo.
No Brasil, o refinanciamento das casas é um mecanismo arriscado?
Tem que separar essa questão. Para muitas pessoas, o custo de crédito
no Brasil é alto. É muito difícil para as empresas, principalmente
pequenas, conseguirem crédito para investir. Então, quando as pessoas
conseguem usar a casa para fazer um financiamento e usam aquele dinheiro
para investir no negócio, talvez seja a forma mais barata de capital
para eles usarem. Isso é bom porque as pessoas conseguem acesso ao
crédito para investir na produção com um juro mais baixo. Mas sempre tem
risco. Sempre que qualquer empresa, que qualquer pessoa se endivida,
tem o risco primeiro do negócio dar errado e ele não conseguir pagar o
empréstimo. E segundo, na questão do mercado imobiliário, há o risco do
preço da casa cair e a pessoa ter aquela dívida enorme, o negócio não
dar certo, ficar sem dinheiro para pagar o financiamento e aí, quando o
banco vem para cobrar a pessoa e ela vende a casa, o dinheiro da venda
não é suficiente para cobrir o empréstimo. Em tempos normais, é uma
ótima estratégia, que oferece risco, mas é uma ótima estratégia. O
problema é descobrir se vai demorar muitos anos para se ter a próxima
recessão, a próxima crise, ou se estamos pertinho de acontecer a próxima
recessão. Isso é muito difícil de prever. O que a gente sabe é que
qualquer mercado, inclusive o imobiliário, não cresce 10% ao ano, todo
ano, para sempre.
No Brasil, qual a sua avaliação do mercado imobiliário?
Acompanho pouco. O que posso dizer é que no Brasil, agora, a situação é
diferente dos Estados Unidos diante da crise. É diferente em muitos
sentidos. O Brasil ainda é um País em desenvolvimento. O acesso ao
crédito aqui é muito difícil. Está melhorando, mas ainda é muito
difícil. O nível de endividamento das pessoas aqui está maior do que era
há cinco, dez anos atrás, mas ainda é bem menor do que nos Estados
Unidos. Estas coisas são boas. Mas o que assusta um pouco é que o
mercado de trabalho daqui é muito mais instável. E as famílias em geral
têm bem menos poupança, em comparação às pessoas de lá. Então, se uma
crise acontecer e mesmo que seja uma recessão baixa, a gente não tem
muita cobertura, muita proteção, para ajudar naquele momento. Isto deixa
as pessoas e as empresas muito mais vulneráveis a qualquer tipo de
crise. Mesmo com o nível de endividamento sendo menor, mesmo com esta
questão de que o Brasil tem uma perspectiva de crescimento muito maior,
pois é um País em desenvolvimento, no geral, o País e as pessoas são
muito mais vulneráveis a crises. Pela experiência passada a gente sabe
que, toda vez que tem uma recessão mais forte, há um sofrimento
dramático e demora até as coisas se recuperarem.
Aqui se
percebe que o valor do imóvel tem subido e tem muito empreendimento
novo. O risco de recessão tem relação com a capacidade do mercado
continuar crescendo?
Para te responder, vou ligar de novo a questão
da pesquisa do mercado imobiliário com a economia urbana. Maringá se
beneficia muito de ser um polo regional. De atrair os talentos da
região. Porque tem muitas universidades, porque tem muitos empregos que
requerem qualificação profissional, então o talento, de capital
humano, na região, tem muita migração de cidades menores para Maringá.
Isso é uma fonte de crescimento muito grande e isso não vai mudar nos
próximos anos. Vai crescer ainda mais. É mais provável que, no futuro, a
região de Maringá cresça muito massivamente, que as cidades vizinhas
pequenas percam pessoas para cá, e que aqui continue crescendo.
Atraindo mais setores novos, de serviços, da indústria, e continuando
com a agroindústria que é um setor mais tradicional daqui. Por ser polo
regional e por conseguir aglomerar um número grande de empresas e de
pessoas, a perspectiva para o mercado é positiva.
http://www.odiario.com/cidades/noticia/760676/nenhum-mercado-cresce-10-ao-ano-para-sempre/