Em toda a história da universidade, foram obtidos apenas oito registros
Burocracia e demora na análise são criticadas por pesquisadores
Depois de desenvolver um produto para o tratamento de fungos que podem acometer mulheres, e de ter o apoio da indústria do setor, a pesquisadora da Universidade Estadual de Maringá (UEM) Selma Lucy Franco tentou, em 2006, patentear o invento. Dez anos depois, e já aposentada, Selma ainda aguarda do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) o registro de patente.
Num dos universos mais burocráticos do governo federal (o Inpi é ligado ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços), a situação de Selma é regra entre os pesquisadores, e não exceção. Apenas a UEM possui 93 pedidos de patente depositados no Inpi, sendo que 80 já são analisados pelo instituto e 13 ainda estão em fase de sigilo – período que leva até 18 meses.
Conquistas nessa área são raridades. De acordo com o Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT) da UEM, a instituição teve apenas oito patentes concedidas, sendo que uma delas já caiu em domínio público. Nenhuma dessas cartas-patente foi emitida em menos de oito anos e a mais demorada levou 11 anos. Na UEM, a considerar os registros de patente obtidos, a espera leva em média nove anos.
Desde 2000
Segundo o chefe de divisão em Propriedade Intelectual do NIT, Angelo Marcolino Junior, dos 80 pedidos em análise o mais antigo na fila do Inpi já aguarda pela carta-patente – que é o título de propriedade temporária sobre uma invenção – há 16 anos.
A demora gerou descontentamento da autora do pedido, a pesquisadora do Departamento de Farmacologia e Terapêutica da UEM Elisabeth Aparecida Audi. "Já estou quase aposentando e não acredito mais que sairá alguma coisa", diz ela, que tem ainda outro pedido na fila do Inpi.
No invento, que aguarda desde 2000 pela carta-patente, Elizabeth pesquisou uma nova forma de utilização da química do guaraná para uso como antidepressivo. Pós-doutora em farmacologia pelo Centro Nacional para a Pesquisa Científica (CNRS) da França, ela critica o amadorismo do registro de patente no Brasil na comparação com os países desenvolvidos, como os Estados Unidos e a própria França. "Lá é bem mais rápido", comenta.
A demora causa prejuízo aos pesquisadores e à universidade. Selma, que teve um caso citado no início da reportagem, ainda tem outros seis pedidos depositados no Inpi, o mais antigo deles data de maio de 2015. "Acho que o dia que sair (a carta-patente) as invenções não vão mais valer nada", lamenta.
Doutora em Tecnologia Farmacêutica pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara, Selma explica que o pesquisador tem apenas 20 anos para explorar a invenção. O problema é que o tempo começa a contar do momento em que o pedido é depositado no Inpi e não quando a carta-patente é concedida. Segundo ela, os poucos anos que restam após o produto ser patenteado, muitas vezes, inviabilizam sua comercialização – já que a invenção poderá der utilizada de graça após cair em domínio público.
No produto que desenvolveu para o tratamento de fungos, Selma obteve o apoio da indústria, que a ajudou a aprovar a patente em países da Europa, Ásia e nos Estados Unidos. "A indústria tinha o interesse no produto e ajudou com a patente no exterior, que custou cerca de R$ 200 mil", lembra. A patente do mesmo produto, no Brasil, segue sendo um sonho distante.
Falta de funcionários atrasa concessões
No Núcleo de Inovação Tecnológica da Universidade Estadual de Maringá (UEM), o chefe de divisão em Propriedade Intelectual, Angelo Marcolino Junior é quem faz a ponte entre os pesquisadores da instituição, que anseiam ter seus inventos patenteados, e o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi), que não dá conta da demanda. "Estão depositados no Inpi cerca de 238 mil pedidos de patente aguardando exame. E o instituto tem apenas 193 examinadores", conta.
Cálculo rápido revela que cada examinador tem mais de 1.230 processos para examinar. Segundo Marcolino, é por isso que os atrasos podem resultar em mais de dez anos de espera pela carta-patente. "Embora sejam publicadas cerca de 25 mil decisões por ano, outras 30 mil solicitações são depositadas", comenta, sobre o aumento da demanda de trabalho no Inpi.
Em constante contato com o Inpi, Marcolino diz que o instituto tem tomado medidas para diminuir a espera, entre as quais recomposição do defasado quadro de examinadores.
Mais antiga
A patente mais antiga da UEM foi conquistada em 2008 com um projeto coordenado pelo professor pós-doutor em Física, Mauro Baesso, atual reitor. Ele construiu um vidro que substitui o cristal utilizado em lasers para cirurgias.
TRÊS PERGUNTAS À PROFESSORA... CÉLIA
REGINA TAVARES
Professora
conseguiu dois registros
A Universidade Estadual de Maringá (UEM) tem apenas oito patentes. Uma já caiu em domínio público e duas foram obtidas pela professora do Departamento de Engenharia Química, Célia Regina Granhen Tavares. Pró-reitora de Pesquisa e Pós-graduação da UEM, ela aguardou por oito anos pela concessão das duas cartas-patentes.
1 A senhora teve dois pedidos de patente concedidos. Do que tratam os projetos?
— "São sobre processos de tratamento de efluentes. A primeira trata de um processo de tratamento de efluentes têxteis por processo fúngico e a segunda de um tratamento avançado com reagente Fenton para o tratamento de efluentes gerados em laboratórios.
2 Levou quanto tempo para a análise desses pedidos? Estava dentro de sua expectativa?
— "Ambos os pedidos levaram cerca de oito anos para que a análise fosse concluída e as cartas-patentes fossem concedidas. Nós sempre esperamos que o processo seja mais rápido, no entanto, já sabíamos que esse tempo seria longo, pela experiência de pedidos de outros pesquisadores.
3 Essa demora prejudicou de alguma forma seus inventos?
— "A demora prejudica um pouco, uma vez que sempre ficamos receosos em fazer qualquer negociação de transferência da tecnologia, que por si só já é um processo complicado. Essa demora causa certa angústia e decepção.
http://digital.odiario.com/cidades/noticia/2290102/uem-tem-93-pedidos-de-patentes-na-fila-do-inpi